sexta-feira, 19 de setembro de 2014

Exposição Hibridismo


HIBRIDISMO
A mostra HIBRIDISMO de Bino Sousa apresenta dupla ambientação artístico cultural, uma delas trata de genuíno produto da imaginação centrada nos mitos e lendas regionais, a partir de uma nova leitura iconográfica das figuras folclóricas da Matinta Pereira, Mulher de Branco, Pé de Garrafa e a Porca de Bobs, que evocam emoções e sentimentos expressados do sistema nervoso central, mas são fantasmagorias poéticas, medos próprios da infância, oriundos do sobrenatural. E porque não dizer um medo gostoso que instiga o imaginário, dando margem a criação artística.

A outra parte da mostra diz respeito também aos sentimentos humanos, só que de forma tosca, caótica, agonizante, hostil, afinada com a insegurança e, longe de ser lenda urbana, é acima de tudo a expressão máxima de uma realidade aterrorizante e bestial do ser humano, presente nas ruas e tão bem esclarecidas pelos jornais: são manchetes ilustradas com figuras sanguinárias, cenas de barbárie, medo e dor. Com esse material o artista faz colagens e intervenções que constituem sua obra, sua proposta de um debate mais profundo que transcenda a percepção e a reflexão sobre a violência ou estado de “ignorância”.

Nas formas engajadas dessa arte de Bino Sousa está o alerta sobre o limite de uma situação humana degradante, torturante e mórbida, numa época em que todos no fronte do poder propalam sobre saúde, educação e segurança, principalmente agora, neste momento de caça ao voto. E neste momento da história da evolução humana, em que a ciência tem tantas respostas, pergunta-se o que é isso, esse retrocesso para as trevas, em que estamos constantemente nos sentindo caçados por nossos contemporâneos.



                                                   Maria Vitória Martins Barros

                                                                               Galerista e artista visual





A IMINENTE POÉTICA DE BINO SOUSA
Prof. Dr. Alexandre Santos Filho (Alixa)

Mito, linguagem, grafitagem, violência. Forma estética, cultura da diferença, Interculturalidade, o belo e não-belo. São aspectos envolventes na obra de Bino Sousa. Mais que tudo isso, são aspecto políticos que se mostram como sinais da intelectualidade artística em constante inquietação, transformação. Traduz-se nos deslocamentos da estética e da poética, construídos no território amazônico, no sudeste paraense, identidades promíscuas, mistas.
A fronteira que Bino desafia ampliar é tocada por saberes muito tênues entre o poético e o estético, pois transita entre a ilustração e a construção contemporânea de arte e a grafitagem. Aliás, é isso que vale significar hibridismo. Misturas que se estabelecem não na imagem que constrói, mas na sua forma intelectual de abordar a criação artística.
Quer dizer, estabelece um encontro, um diálogo entre os aspectos temáticos que traz como ponto de hibridização e que na sua tessitura provoca e desafia o espectador a transitar como um transeunte no território de muitas identidades e muitas transversalidades. Daí o exotismo, a não unidade global, a busca constante de mostrar o que já foi visto e não pensado como tema na arte. O deslocamento que Bino provoca a desnaturalização da poética, um modo de fazer arte com o mais comum incomunicável, o incomensurável.
Arte pop, neoexpressionismo e a visão poética de Jean Michel Basquiat podem representar um percurso de intensa busca em Bino. Desse sentimento interiorizado, possivelmente nasce um hibridismo poético, calcado em uma situação de acolhimento e rejeição, da agradabilidade visual e do desagradável sentimento que se instala no olhar e no pensamento. Admitamos, o que está por traz dessa operação hibrida de sentido perpassa pelo discurso visual ao não pensado e a muda narrativa, tomados como clichê, sem palavras para operar o imaginário e ao mesmo tempo com as palavras para se referir à estetização do cotidiano.
Ainda poder-se-ia tomar como referência de um expressionismo contemporâneo a arte de Rainer Magold, pelo trânsito dos retratos inconscientes do cotidiano, mas Bino traz em sua poética da imersão o fazer tradicional com pincel e tela, e não só isso a desconstrução da imagem pictórica.
Contudo, é de Roy Lichtenstein que Bino rouba a cena de sua referência. E a sua construção gráfico visual traduz o discurso de sua pesquisa por meio dos clichês e das múltiplas narrativas impregnadas do imaginário próximo da territorialidade cabocla. Tudo isso se misturam nessa poética. Portanto é um processo de hibridização que envolve prática, artefato artístico e o sentimento de pertencimento a uma comunidade.