A
mostra HIBRIDISMO de Bino Sousa apresenta
dupla ambientação artístico cultural, uma delas trata de genuíno produto da imaginação
centrada nos mitos e lendas regionais, a partir de uma nova leitura iconográfica
das figuras folclóricas da Matinta Pereira, Mulher de Branco, Pé de Garrafa e a
Porca de Bobs, que evocam emoções e sentimentos expressados do sistema nervoso
central, mas são fantasmagorias poéticas, medos próprios da infância, oriundos
do sobrenatural. E porque não dizer um medo gostoso que instiga o imaginário,
dando margem a criação artística.
A
outra parte da mostra diz respeito também aos sentimentos humanos, só que de
forma tosca, caótica, agonizante, hostil, afinada com a insegurança e, longe de
ser lenda urbana, é acima de tudo a expressão máxima de uma realidade
aterrorizante e bestial do ser humano, presente nas ruas e tão bem esclarecidas
pelos jornais: são manchetes ilustradas com figuras sanguinárias, cenas de
barbárie, medo e dor. Com esse material o artista faz colagens e intervenções que
constituem sua obra, sua proposta de um debate mais profundo que transcenda a
percepção e a reflexão sobre a violência ou estado de “ignorância”.
Nas
formas engajadas dessa arte de Bino Sousa está o alerta sobre o limite de uma
situação humana degradante, torturante e mórbida, numa época em que todos no
fronte do poder propalam sobre saúde, educação e segurança, principalmente
agora, neste momento de caça ao voto. E neste momento da história da evolução
humana, em que a ciência tem tantas respostas, pergunta-se o que é isso, esse
retrocesso para as trevas, em que estamos constantemente nos sentindo caçados
por nossos contemporâneos.
Maria Vitória Martins Barros
Galerista e artista visual
A
IMINENTE POÉTICA DE BINO SOUSA
Prof. Dr. Alexandre Santos Filho
(Alixa)
Mito,
linguagem, grafitagem, violência. Forma estética, cultura da diferença,
Interculturalidade, o belo e não-belo. São aspectos envolventes na obra de Bino
Sousa. Mais que tudo isso, são aspecto políticos que se mostram como sinais da
intelectualidade artística em constante inquietação, transformação. Traduz-se nos
deslocamentos da estética e da poética, construídos no território amazônico, no
sudeste paraense, identidades promíscuas, mistas.
A
fronteira que Bino desafia ampliar é tocada por saberes muito tênues entre o
poético e o estético, pois transita entre a ilustração e a construção
contemporânea de arte e a grafitagem. Aliás, é isso que vale significar
hibridismo. Misturas que se estabelecem não na imagem que constrói, mas na sua
forma intelectual de abordar a criação artística.
Quer
dizer, estabelece um encontro, um diálogo entre os aspectos temáticos que traz
como ponto de hibridização e que na sua tessitura provoca e desafia o
espectador a transitar como um transeunte no território de muitas identidades e
muitas transversalidades. Daí o exotismo, a não unidade global, a busca
constante de mostrar o que já foi visto e não pensado como tema na arte. O
deslocamento que Bino provoca a desnaturalização da poética, um modo de fazer
arte com o mais comum incomunicável, o incomensurável.
Arte
pop, neoexpressionismo e a visão poética de Jean Michel Basquiat podem
representar um percurso de intensa busca em Bino. Desse sentimento interiorizado,
possivelmente nasce um hibridismo poético, calcado em uma situação de
acolhimento e rejeição, da agradabilidade visual e do desagradável sentimento
que se instala no olhar e no pensamento. Admitamos, o que está por traz dessa
operação hibrida de sentido perpassa pelo discurso visual ao não pensado e a
muda narrativa, tomados como clichê, sem palavras para operar o imaginário e ao
mesmo tempo com as palavras para se referir à estetização do cotidiano.
Ainda
poder-se-ia tomar como referência de um expressionismo contemporâneo a arte de
Rainer Magold, pelo trânsito dos retratos inconscientes do cotidiano, mas Bino traz
em sua poética da imersão o fazer tradicional com pincel e tela, e não só isso
a desconstrução da imagem pictórica.
Contudo,
é de Roy Lichtenstein que Bino rouba a cena de sua referência. E a sua
construção gráfico visual traduz o discurso de sua pesquisa por meio dos
clichês e das múltiplas narrativas impregnadas do imaginário próximo da
territorialidade cabocla. Tudo isso se misturam nessa poética. Portanto é um
processo de hibridização que envolve prática, artefato artístico e o sentimento
de pertencimento a uma comunidade.
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